10.11.04

SILÊNCIO





A PALAVRA IMPOSSÍVEL


Deram-me o silêncio para eu guardar dentro de mim
A vida que não se troca por palavras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
As vozes que só em mim são verdadeiras.
Deram-mo para eu guardar dentro de mim
A impossível palavra da verdade.

Deram-me o silêncio como uma palavra impossível,
Nua e clara como o fulgor duma lâmina invencível,
Para eu guardar dentro de mim,
Para eu ignorar dentro de mim
A única palavra sem disfarce -
A Palavra que nunca se profere.



Adolfo Casais Monteiro


(De «Poesias Completas de Adolfo Casais Monteiro»,
Organização e prefácio de João Rui de Sousa,
Casa da Moeda/Imprensa Nacional, 1993)

Adolfo Casais Monteiro (n. Porto, 4/7/1908; São Paulo, 24/7/1972). Segundo uma nota biobibliográfica de João Paulo Monteiro sobre o poeta e ensaísta, este «publicou, em 1929, "Confusão", primeiro livro de poemas, e em 1933, "Considerações Pessoais", colectânea dos primeiros ensaios críticos. Em 1931 passou a integrar a direcção da revista "Presença". Em 1933, publicou com o poeta brasileiro Ribeiro Couto a colectânea poética "Correspondência de Família", primeiro marco de uma estreita cooperação com os principais intelectuais brasileiros do seu tempo. Em 1937, foi demitido do cargo de professor pela ditadura salazarista. Em 1939, mudou-se para Lisboa, a fim de ganhar a vida como escritor. Preso várias vezes, entre os seus muitos livros de poesia há dois que dão especial vazão à sua revolta política: "Canto da Nossa Agonia" (1942) e "Europa" (1946). Neste mesmo ano tornou-se director da revista "Mundo Literário", depois de ter publicado volumes de ensaios sobre Ribeiro Couto, Jules Supervielle e Manuel Bandeira. Em 1954 foi para o Brasil, e a breve trecho o activo papel que desempenhou na oposição no exílio tornou impossível o seu regresso. Publicou crítica literária e outras formas de ensaio em numerosas revistas e jornais. Foi professor de literatura em universidades do Rio de Janeiro, Bahia e, finalmente, São Paulo, onde, em Araraquara, ocupou, a partir de 1962, a cátedra de Teoria da Literatura. Em 1969, as suas "Poesias Completas" incluíram o conjunto inédito dos poemas escritos no exílio, com o expressivo título de "O Estrangeiro Definitivo".»



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