25.2.04

POEMA DO DIA



Mulheres rodeadas pelo voo de um pássaro, Miró, 1940

SÓ UM LUGAR

Pode haver um lugar só de palavras
onde os verbos respirem devagar
e vivam como um canto adormecido:
alimento do mundo e seu pulsar.

Pode ser o silêncio em seu lugar,
a luz antes dos sons, a roda nova
do calor de outro tempo, inaugural:
o ouro no cadinho, água lustral.

É por isso que escrevem os poetas,
em demanda de um centro escondido.
É por isso que cantam os doentes,
quando esperam o vento da alegria.

Os pintores procuram outras cores.
Pintam segredos, festas, luz e sombras.
Desenham linhas brancas, pensamentos.
Tocam matérias soltas, coloridas.

Os músicos caminham pelas esferas.
Rodam nos sete céus, sobre os anéis.
Dançam na espiral do Universo.
Compõem o segredo dos caminhos.

Os arquitectos erguem casas novas.
Trazem o sol à pele, ao meio-dia.
Levantam arcos, guardam um saber.
Iluminam colunas, chamam névoas.

Os escultores passeiam pelas formas.
Os pedreiros respiram outros sóis.
Pescadores levantam espumas novas
para a festa dos homens sempre iguais.


(Firmino Mendes, in Um Segredo Guarda o Mundo,
Pedra Formosa, Guimarães, 1998)


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