26.7.06

ESPINOSA




Nenhum dia é igual a outro e hoje, aqui sentado
neste banco de um jardim de Beja, deu-me para
pensar em ti, Baruch hebraico, Bento português.
O teu pai Miguel andou por aqui há quase quatro
centenas de anos. Parece que nasceu bem perto,
na Vidigueira das vinhas e do sol.

E tu nasceste em Amsterdão de pais fugidos à Inquisição.
Aprendeste a falar e a escrever português, a língua
de outros documentos da tua comunidade.
Quiseste saber mais do que o que te ensinavam e
foste excomungado, condenado ao banimento. Leio
agora o documento que te expunha à sombra dos homens,
que amaldiçoava as tuas horas de todos os dias,
o teu deitar e levantar, o teu entrar e o teu sair.

Mas os lugares por onde entravas ou saías
passaram a ser longe de Amsterdão - assim sorriste
à exclusão. Acusaram-te de liberdade, de pensamentos
perversos, de não acreditares que há só um povo escolhido
para a realização dos desígnios divinos.

Esta memória de ti leva-me às flores do campo:
- o teu túmulo merece uma papoila vermelha.


in "Um Segredo Guarda o Mundo", Pedra Formosa Edições

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